Sou consciente de ter entrado no espaço aéreo japonês cometendo uma grande gafe. Embarquei com o nariz completamente congestionado e a garganta doendo, apostando numa gripe cavalar pros dias que se seguiriam e, mesmo assim, não privei nenhum dos meus colegas de avião do meu ar usado. Havia aprendido pouco antes de viajar que as máscaras cirúrgicas usadas aqui não servem para proteger as pessoas da poluição, mas sim dos vírus. Eu já sabia, não posso negar. Mas ainda não estava muito claro se era o doente que deveria se tapar ou o saudável. Pelo que aprendi na semana subseqüente, diria que são os dois, ou todos em volta.
A minha gripe não aconteceu, o que me deu um alívio estranho. Eis que, frio vai frio vem, uma das pessoas que mora comigo foi diagnosticada com influenza. Aqui, eles usam essa palavra pra fazer a tal diferença que nós não fazemos entre resfriado (aquela coisa boba) e gripe (a que te derruba).
No início do dia, cruzo com a moça pelo corredor, ela diz que acordou doente e tudo segue normal, cada uma vai trabalhar no seu horário mas, quando eu chego lá, cabum. É um daqueles filmes sobre o ébola, quando o ébola era risco para a humanidade. É aquela, diz um. E outra colega vem me abordar.
Tu mora com a fulana, não? Sim. Pois então, ela está com influenza. Ah, gripe. Pois é, ela disse que não se sentia bem hoje de manhã. Então, mandamos ela ao médico e depois para casa. Ela nem deveria ter vindo. Ahn. Tens que ter muito cuidado em casa. Usa a máscara, hein? Ahn. Não estás sentindo nada? Não-não. Não. Ok, usa a máscara (dedinho em riste).
E assim, antes que eu pudesse escolher, a máscara se tornou uma realidade - com outros comentários sobre a minha geografia virótica feitos no decorrer do dia. Voltei pra casa com um pacote delas na bolsa; abri a porta pra ver um ser mascarado convalescente; percebi na prática que bebericar qualquer coisa tapando o rosto é impossível.
Há algo no ar do qual estamos fugindo aqui. E é a mesma coisa que trocávamos no colégio, em refrigerantes, beijos e escorregadas pra cima do caderno alheio. Tanta confusão que esquecemos que sabemos o nome certo do vírus. É influenza, sempre foi, só que na nossa escala brasileira acabou como o ponto máximo de uma mesma coisa, um belo “gripão”.
Nas regras de convivência japonesas, no entanto, dizemos tintim por tintim da sintomatologia do outro, cuidamos dele com sopas e vitaminas, esperamos a febre passar. Em contrapartida, nos acusamos quando somos atingidos, tal qual um jogo de faroeste infantil. É simples, lógico e tão, mas tão mais eficaz para o comunitário que não calculo mais que duas semanas para eu parar de odiar a máscara.
1 commentaire:
só um cometário: ai meu deus, do tipo "oh my god" da Janice do Friends!!
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